Cosmos aproxima pessoas de baixa renda do acesso à justiça e GID promove atendimento humanizado à comunidade LGBTQIAPN+
Erlane Alves dos Santos (ou Lane Alves) é graduada em Direito pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e mestra em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), instituição em que cursa doutorado em Administração. Toda a pós-graduação tem sido cumprida com bolsas CAPES/MEC. A esses títulos somam-se prêmios de empreendedorismo e inovação que a pós-graduanda recebeu em cerimônia em Praga, na República Tcheca.
Fale sobre o prêmio que você ganhou.
A premiação em questão é o Triple E Awards 2025, que reconhece profissionais e instituições em nível global que demonstram compromisso em promover a “terceira missão” das universidades, o envolvimento ativo na transferência de conhecimento através do impacto positivo promovido à sociedade. É organizado pelo Accreditation Council for Entrepreneurial and Engaged Universities (ACEEU).
Conquistei o People’s Choice Award, ao ser a mais votada em eleição popular, e alcancei o 4º lugar na categoria Engaged Academic of the Year. O destaque foram minhas contribuições para a criação de duas plataformas virtuais: Cosmos, rede que facilita a conexão de pessoas de baixa renda a projetos de extensão focados em acesso à justiça, e GID: Gênero, Inclusão e Diversidade, voltada à promoção de um atendimento humanizado por profissionais de saúde a pessoas LGBTQIAPN+.
Detalhe, por favor, o que é a GID.
É uma plataforma, em formato de site e aplicativo, que visa conectar profissionais que se comprometam a oferecer atendimento humanizado de saúde para a comunidade LGBTQIAPN+. Isso ocorre porque, mesmo tendo condições de pagar por esses serviços, essa parcela da população ainda enfrenta discriminação ao buscar atendimento. Para enfrentar esse cenário, realizaremos uma análise de currículo e de capacitação profissional, garantindo que os atendimentos sejam prestados de forma ética e humanizada. Atualmente, já contamos com uma rede de mais de 100 profissionais de saúde, atuando nas áreas de Medicina, Nutrição e Psicologia.
Somos uma equipe de 11 pessoas de diferentes estados do país: Ceará, Pará, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, São Paulo… Todo mundo trabalha voluntariamente. Pretendemos, se não no final deste ano, lançar de vez o aplicativo no início de 2026. Nessa viagem a Praga, conheci investidores interessados no projeto por causa do propósito que temos. O pink money (dinheiro gerado pela comunidade LGBTQIAPN+) muitas vezes é capturado por pessoas sem compromisso com os direitos da população. Queremos que esse dinheiro gire de fato em favor da comunidade.
E a Cosmos?
A Cosmos: rede de acesso à justiça e extensão universitária nasce da minha experiência como bolsista e como estudante extensionista na UFPel. Lá, tive contato direto com grupos vulnerabilizados da cidade de Pelotas e pude levar suas demandas para a universidade. Para atender essa população, levamos, por exemplo, álcool em gel produzido pelo curso de Farmácia durante a pandemia, para que os projetos seguissem trabalhando de forma protegida. Também houve campanhas de doações de agasalho durante o inverno e workshops de regularização fundiária oferecidos pelo curso de Direito.
Além disso, também fiz extensão focada em acesso à justiça penal e, assim, meu olhar foi moldado a partir dessa empatia. Chego na PUCRS com o objetivo de me aprofundar na área de Ciências Criminais e vejo que as organizações criminosas têm crescido bastante e com o apoio de novas tecnologias. E o foco da minha dissertação passa a ser o atendimento em rede à comunidade vulnerabilizada socioeconomicamente, que também é a mais representada nos números do sistema prisional. Diretamente ou indiretamente, contribuímos também com a Defensoria Pública, que está sobrecarregada.
Desenvolvi uma plataforma, a partir de pesquisa qualitativa em que entrevistei professoras e professores das cinco universidades federais do Rio Grande do Sul, que me apresentaram avanços e desafios da extensão universitária. Levantei dados e estruturei uma estratégia buscando atender a cada demanda comunicada. A plataforma foi apresentada aos/às docentes durante o processo de desenvolvimento, para que fosse possível fazer algo que realmente atendesse às suas necessidades.
Qual a importância da premiação?
O primeiro fator é a validação internacional de que tudo que estou fazendo é algo que realmente impacta a sociedade. Outra coisa importante foi a oportunidade de me conectar com outras instituições ao redor do mundo. Gente da Austrália, China, Emirados Árabes Unidos, Finlândia e Reino Unido, por exemplo. Pude ver o que está sendo desenvolvido e o que está dando certo nesses lugares.
E a importância das agências de fomento?
Sou de Aurora do Pará (PA). Fui a primeira pessoa da minha família a acessar a universidade. E meus parentes não tinham a estrutura financeira para poder bancar o conhecimento de uma pessoa que atravessou o país. Contei com auxílio-moradia e bolsa de pesquisa para me manter na cidade, em Pelotas (RS). No mestrado e no doutorado, o auxílio da CAPES/MEC tem permitido que eu me mantenha voltada para as minhas pesquisas.
Quais os próximos passos?
O futuro das iniciativas está diretamente ligado ao fortalecimento de redes colaborativas dedicadas à justiça social, diversidade e inovação. A plataforma Cosmos está chegando ao fim de sua fase de desenvolvimento e em breve começará a ser expandida nacionalmente, conectando projetos de extensão universitária com comunidades em todo o país. Além disso, incluiremos indicadores de alcance dos 18 ODS da Agenda 2030 da ONU.
O projeto GID: Gênero, Inclusão e Diversidade deverá evoluir para uma incubadora de soluções tecnológicas voltadas para a comunidade LGBTQIAPN+, com foco em saúde, direitos, empregabilidade e educação. Iniciativas estratégicas também estão planejadas para fomentar inovações interseccionais, com atenção especial às populações negras, indígenas, imigrantes e outros grupos sub-representados.
Academicamente, continuarei avançando na minha pesquisa de doutorado, que se concentra no desenvolvimento de uma estrutura inclusiva e replicável capaz de ampliar o impacto dos ecossistemas de inovação na redução das desigualdades sociais. O objetivo fornecer um guia prático para organizações que buscam transformar suas práticas de diversidade, equidade e inclusão (DEI).
No cenário internacional, planejo escalar as plataformas e estabelecer parcerias com universidades e polos de inovação em todos os continentes, promovendo a troca de conhecimento e democratizando o acesso à educação, tecnologia e justiça socioambiental.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
Fonte: Redação CGCOM/CAPES
Foto de capa: Lane Alves com os prêmios conquistados no Triple E Awards 2025 (Arquivo pessoal)