Se pretender fazer frente às transformações sociais, econômicas e tecnológicas do país, o novo PNE precisará dar mais atenção, também, a um reposicionamento do ensino superior
O novo Plano Nacional de Educação (PNE), cujo projeto de lei está em tramitação no Congresso Nacional, representa uma oportunidade essencial para atendimento às necessidades urgentes da educação brasileira, como a consolidação do acesso universal, a ampliação da permanência na escola, a melhoria da qualidade do ensino, a valorização dos profissionais de educação e a preparação dos indivíduos para a cidadania e o trabalho. Mas, se pretender fazer frente às transformações sociais, econômicas e tecnológicas do país, a construção desse novo futuro para a educação do Brasil precisará dar mais atenção, também, a um reposicionamento do ensino superior.
É imprescindível que o novo PNE contemple alguns eixos fundamentais para poder promover inclusão com qualidade, garantir a permanência dos jovens que acessam a educação universitária e estimular a formação continuada para milhões de brasileiros que anseiam por melhores oportunidades.
O primeiro desses eixos é o da valorização da pluralidade institucional. O Brasil tem um sistema de ensino superior diversificado, integrado por universidades, centros universitários, faculdades, institutos federais, cursos EaD e cursos noturnos, no qual a rede privada responde por 79,3% das matrículas. Se o PNE focar apenas nas universidades de pesquisa, deixará de fora grande parte do sistema, prejudicando um contingente expressivo de alunos.
O segundo eixo diz respeito a reforçar a democratização do acesso, a permanência e a conclusão. A taxa líquida de escolarização na faixa de 18 a 24 anos no Brasil é de apenas 19,9%, ou seja, menos de um em cada cinco jovens chega ao ensino superior. Não basta abrir vagas, é preciso garantir permanência e conclusão, apoiadas pelas novas tecnologias.
Outra necessidade é a adoção de novos parâmetros de qualidade para a graduação. É fundamental que a qualidade seja medida também por empregabilidade, inovação didática, uso de tecnologias e resultados de aprendizagem, e que os novos critérios atentem para as diferenças entre o presencial e a EaD.
É preciso considerar que, em 2023, a taxa de evasão foi de 40,1% na EaD e de 26,4% no presencial, e que, dos 24,6 milhões de vagas ofertadas (23,6 milhões na rede privada e 1 milhão na pública), apenas 20,2% foram ocupadas (18,7% na rede privada). Nesse cenário, é urgente a retomada das vagas remanescentes do Prouni e do Fies, que, entre 2020 e 2023, perderam, respectivamente, 28,7% e 49,8% de beneficiários.
É imprescindível, ainda, a reconfiguração das engenharias, cursos em que a evasão chega a quase 40%, por meio de uma revisão curricular, do nivelamento em matemática e ciências e da adoção de práticas antecipadas de CDIO, que integram o conhecimento técnico com competências práticas, sociais e profissionais.
Outro eixo fundamental é a pós-graduação. O novo PNE deve equilibrar a valorização do stricto sensu com o lato sensu, especialização que hoje é a principal via de formação continuada, com 1,6 milhão de alunos em 2024, enquanto o stricto sensu encolheu 34% entre 2019 e 2023. O novo plano deve valorizar o lato sensu como formação profissional estratégica, criando um censo dos cursos de pós-graduação e reequilibrando as políticas de regulação e financiamento para essas especializações.
A formação e valorização docente é outro aspecto fundamental, já que sem professores bem preparados não há avanço educacional. O novo PNE deve priorizar a adoção de planos de carreira estruturados, o aumento do número de licenciados atuando em sua área, a assistência estudantil específica para licenciaturas e a inclusão de competências em ciência, tecnologia, engenharia e matemática, para aumentar a atratividade da carreira docente e assegurar resultados consistentes de aprendizagem.
Finalmente, o novo PNE deve dar atenção à educação a distância, modalidade que é estratégica para democratizar o acesso porque atinge públicos historicamente excluídos. Em 2023, mais de 843 mil alunos de 40 a 49 anos e 283 mil com mais de 50 anos estavam matriculados na EaD. Por isso, é necessária a adoção de parâmetros próprios de qualidade para a EaD, que incluam permanência, engajamento e suporte estudantil, e maior incentivo a modelos inovadores, com uso de recursos digitais de qualidade.
O Brasil precisa de um Plano Nacional de Educação moderno, inclusivo e conectado às demandas sociais, tecnológicas e produtivas. Sem que seus formuladores deem a devida atenção a essas questões, dificilmente o PNE conseguirá ampliar o acesso, assegurar a permanência, promover a qualidade e fortalecer a diversidade institucional da educação superior brasileira.
Fonte: Correio Braziliense
Foto de capa: crédito: Caio Gomez