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Polos EAD na mira do MEC: visitas a unidades em Porto Alegre revelam falhas e desafios para cumprir novas exigências até 2027

Espaços visitados pela Zero Hora estavam em condições que demandarão melhorias para adequação às mudanças nas regras da modalidade. Haverá fiscalização do MEC

Alvo de novo marco regulatório promovido pelo Ministério da Educação (MEC), o ensino a distância (EAD) deve se transformar nos próximos anos no Brasil. Com a exigência de reforço na oferta de áreas e atividades presenciais, instituições que, até hoje, apostaram em polos pequenos e estruturas enxutas precisarão rever suas operações, sob pena de terem as portas fechadas.

Mesmo quando um curso é 100% EAD, os estabelecimentos são obrigados a ter um polo, onde o aluno pode procurar atendimento presencial. Uma portaria de 2017 prevê que os locais tenham salas de aula ou auditório, laboratório de informática, sala de tutoria (o tutor tem atuação administrativa, não pedagógica) e ambiente para apoio técnico-administrativo. Laboratórios específicos e biblioteca podem ser oferecidos de forma digital.

No dia 19 de maio de 2027, quando for encerrado o prazo de dois anos para a adequação às mudanças estabelecidas este ano, os polos deverão ter, no mínimo, a seguinte infraestrutura:

  • Recepção
  • Sala de coordenação
  • Salas ou ambientes para estudos individuais e coletivos, compatíveis com as atividades dos cursos ofertados e com o número de estudantes que deverão utilizá-las
  • Laboratórios e outros espaços formativos compatíveis com as atividades dos cursos ofertados
  • Equipamentos e dispositivos de acesso à internet e conexão de internet estável e de alta velocidade

novo marco proíbe o compartilhamento de polos com outras instituições de Ensino Superior, algo comum atualmente – até junho, o Rio Grande do Sul tinha 2.852 polos EAD registrados junto ao MEC, sendo 341 em Porto Alegre, muitos deles com endereços compartilhados.

O regramento também estabelece que as unidades designem um responsável para apoiar os estudantes nas rotinas acadêmicas, como a realização de avaliações de aprendizagem presenciais e na articulação de parcerias relacionadas às práticas em ambientes profissionais, estágios e atividades de extensão. Até então, existia somente a figura do tutor.

Presidente da Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed), João Mattar entende que dois anos é um tempo adequado para a adaptação não só nos polos, mas com relação ao funcionamento das instituições de modo geral.

— O MEC já disse que há uma abertura para rever tudo, rever o que se mostrar inadequado na implementação, rever a questão dos polos. Então, entendemos que o tempo é adequado, mas, se houver necessidade de reorganizar esse prazo, entendemos que o MEC está aberto a isso — pontua Mattar.

A entidade ainda não consegue elencar por quais dificuldades seus associados têm passado nesse processo. No entanto, sabe que algumas instituições já tinham polos organizados de maneira próxima ao que foi demandado pelo marco; outras não.

Situação dos polos

A reportagem da Zero Hora circulou por oito polos de faculdades EAD na região central de Porto Alegre. Destes, não conseguiu visitar dois – em um, o endereço anunciado no site da instituição estava desocupado; em outro, havia divergência no horário: na internet, a informação era de que o atendimento ocorria até as 17h, mas, no local, um papel afixado na parede alertava para funcionamento até as 14h. Às 13h45min, não havia ninguém.

Além de anunciar cursos de graduação, pós-graduação e mestrado, o estande divulgava serviços para celulares, como venda de películas, capas e fones.

Em nenhuma das seis unidades houve menção, por parte dos atendentes, à qualidade dos cursos oferecidos. Havia dois focos: valor da mensalidade, que variou entre cerca de R$ 100 e R$ 400, e praticidade, com graduações com poucas atividades práticas, a maioria concentrada nos últimos semestres.

Das unidades visitadas, apenas duas tinham uma estrutura mais robusta, dotada de uma quantidade maior de laboratórios e salas de aula. Mesmo nessas, contudo, havia precariedades.

Em um dos polos, não foi possível conhecer os laboratórios, pois só ficam abertos em dias de aula. No outro, o laboratório do curso de Nutrição era usado como cozinha e contava com micro-ondas e fornos. Um diferencial, porém, era a oferta de atividades práticas em uma unidade de graduações presenciais na Região Metropolitana. O local tinha ainda uma biblioteca – um cubículo com 2 metros quadrados com dois computadores e duas prateleiras de livros.

Em outro polo, cursos que têm carga horária prática maior, como os da área da Saúde, concentram essas atividades a partir do terceiro ano de graduação, uma vez por semana, em uma unidade na Zona Norte da Capital. A atendente, no entanto, relatou que essas aulas servem como complemento, não são obrigatórias, não contabilizam faltas e tampouco afetam a nota do aluno. 

A estrutura envolve uma cozinha, duas salas de aula com algumas cadeiras – não o número necessário para as turmas de 30 a 50 pessoas relatadas no atendimento –, três computadores localizados em um saguão e alguns livros que podem ser consultados pelos estudantes apenas no local.

No quarto polo visitado, a estrutura se resumia a um cubículo com duas pessoas atendendo quem chegava pedindo informações. O local não possui laboratórios, biblioteca ou salas de aula, mas, em caso de necessidade do estudante, disponibiliza um dos computadores para seu uso no local.

No quinto e no sexto polos, as estruturas eram compartilhadas entre instituições. As realidades, contudo, eram muito diferentes nos dois. Em um deles, o espaço era grande, ocupado principalmente por uma escola técnica que fez uma parceria com a faculdade. 

No entanto, apesar de a estrutura espaçosa, laboratórios e outros ambientes são usados exclusivamente pelos cursos técnicos – somente as salas de aula são disponibilizadas para provas presenciais das graduações do EAD. Atividades práticas dos cursos ocorrem em outra unidade do estabelecimento, na Zona Sul.

No sexto polo, a reportagem chegou ao endereço indicado no site, porém, foi informada de que aquela instituição já não operava mais lá – o espaço era ocupado por outras duas. Há um laboratório de informática e duas salas de aula. Para os cursos da área da Saúde, como Biomedicina, Farmácia e Fisioterapia, também havia um laboratório, mas que contava apenas com um microscópio. A explicação foi de que, em atividades práticas, aulas são realizadas em clínicas parceiras.

“Última chance”

Apesar do prazo de dois anos para as adequações ao novo marco, sinais das mudanças já são percebidos em sites de instituições que têm como foco o EAD. Estabelecimentos que oferecem cursos como Enfermagem, que passará a ser obrigatoriamente presencial, e Engenharias, que terão, no mínimo, atividades semipresenciais, exibem banners de “última chance” de se matricular com as regras antigas. 

Outras instituições já estão com cursos sendo ofertados conforme as novas normas. É o caso da UniRitter, que tem 49 polos EAD no RS e anuncia Enfermagem presencial, Fisioterapia como semipresencial e a maioria das Engenharias nas modalidades presencial e semipresencial.

O centro universitário não detalha, mas assegura que está em processo de adequação ao novo modelo, revisitando o “portfólio e desembarcando de cursos que não têm mais tanto apelo, para abrir espaço e investir em cursos indicados para tendência do mercado”. A instituição afirma que tem ampliado a experiência presencial dos estudantes da modalidade EAD desde o ano passado.

O uso de laboratórios físicos há 10 anos mesmo para cursos a distância que, agora, passarão a ser ofertados de forma semipresencial, facilitará o processo de adaptação para a Uninter, que possui 68 polos registrados no Estado. É o caso dos cursos de Engenharias e da área da Saúde.

— O marco regulatório só veio reforçar que a nossa opção pela qualidade que os laboratórios físicos garantem na formação dos alunos foi correta. As adaptações estão concentradas nas reformulações curriculares para nos adequarmos às novas terminologias criadas pelo marco regulatório — pontua o reitor da Uninter, Benhur Gaio.

A instituição deixará de oferecer alguns cursos que passarão para o formato semipresencial, o que poderá acontecer com licenciaturas, por exemplo, e Arquitetura e Urbanismo. A lista das graduações que sairão do portfólio está em processo de análise.

Dona de duas grandes instituições da modalidade EAD – Unicesumar e Uniasselvi –, a Vitru Educação diz que também já investiu, antes mesmo do novo marco, em qualificar sua estrutura física e equipe pedagógica, a fim de atender às necessidades.

Em nota, o grupo, que possui quase 300 polos em municípios gaúchos, informou que 98% das cidades em que empresa possui unidades contam com “infraestrutura bem equipada com laboratórios e salas de aula”. A Virtu não revelou quais investimentos precisará fazer diante da atualização da legislação, mas afirmou que seguirá fazendo “as adequações necessárias”.

Fiscalização do MEC

Procurado, o MEC informou que os polos atuais terão dois anos para se adequarem às novas regras, e que novas unidades a serem criadas já deverão seguir as mudanças. Conforme a pasta, os polos passarão por avaliação in loco por avaliadores do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) no âmbito dos processos regulatórios, a fim de garantir que os espaços estão de acordo com o exigido.

O ministério ainda lembra que “os polos já foram objeto das avaliações periódicas, mas a portaria de 2017 retirou essa obrigatoriedade”. O MEC aponta, por fim que o cadastramento dos polos EAD, “incluindo endereços, cursos e vagas a eles vinculados, são de total responsabilidade das instituições”.

Fonte: GZH

Foto de capa: smolaw11 / stock.adobe.com

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