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RESOLUÇÃO CNE/CES nº 3, de 30/09/2025 – Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina

Ministério da Educação
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
CÂMARA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR
RESOLUÇÃO CNE/CES Nº 3, DE 30 DE SETEMBRO DE 2025


Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina.

O PRESIDENTE DA CÂMARA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, no uso da atribuição que lhe confere o art. 10, inciso VI, da Portaria MEC nº 1.306, de 2 de setembro de 1999, e tendo em vista o disposto no
art. 9º, § 2º, alínea ‘c’, da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131, de 24 de novembro de 1995, e considerando o estabelecido na Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, na Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de
1996, e na Lei nº 12.871, de 22 de outubro de 2013, e com fundamento no Parecer CNE/CES nº 536/2025, homologado por Despacho do Senhor Ministro de Estado da Educação, publicado no Diário Oficial da União – DOU de 30 de setembro de 2025,
seção 1, pág. 160,
resolve:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º Ficam instituídas as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina, com o perfil e competências fundamentais do médico e os princípios e pressupostos para a sua formação, nos termos desta Resolução.
CAPÍTULO II
DO PERFIL DO MÉDICO
Art. 2º O médico deverá ser um profissional com formação geral, sólida, crítica, reflexiva e comprometida com os princípios éticos, humanísticos, científicos e sociais da Medicina.
Art. 3º O médico deverá estar apto para atuar com excelência técnica e sensibilidade humana em todos os níveis de atenção à saúde, da promoção à reabilitação, nos diversos cenários da prática médica, tanto no setor público quanto no privado.
Art. 4º O exercício profissional do médico deverá ser orientado pelo cuidado centrado na pessoa, na família e na comunidade, com compreensão ampliada dos determinantes sociais da saúde, respeito à diversidade humana, valorização da dignidade e compromisso ativo com a equidade, a justiça social e o fortalecimento do Sistema Único de Saúde – SUS.
CAPÍTULO III
DAS COMPETÊNCIAS DO GRADUADO
Art. 5º O médico deverá ser capaz de integrar saberes clínicos, científicos e tecnológicos, com empatia e responsabilidade, atuando como agente de transformação social, com liderança colaborativa, escuta qualificada e enfrentamento dos desafios sanitários, ambientais e digitais do século XXI com ética e autonomia crítica.
Art. 6º A formação médica deve desenvolver competências que possibilitem ao egresso atuar de forma crítica, ética e contextualizada nos campos do cuidado em saúde, da gestão, da pesquisa e da educação, com ênfase nas seguintes áreas:
I – Atenção à Saúde;
II – Gestão em Saúde; e
III – Educação em Saúde.
Art. 7º Espera-se que o médico seja capaz de articular saberes diversos de modo interdisciplinar, colaborativo e comprometido com a qualidade e a segurança do cuidado prestado às pessoas e comunidades.
Art. 8º Ao concluir o Curso de Graduação em Medicina, o egresso deverá demonstrar as seguintes competências, integrando conhecimentos, habilidades e atitudes essenciais para uma prática médica ética, segura e centrada no cuidado integral à saúde:

I – promover ações de fortalecimento da saúde, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação, cuidados paliativos, situações de terminalidade nos diferentes níveis de atenção e em todas as fases do ciclo da vida e em diferentes
contextos do sistema de saúde, público e privado, com foco na integralidade do cuidado e nas necessidades da comunidade;
II – oferecer cuidado compassivo, resolutivo e personalizado, centrado na pessoa, considerando as necessidades, valores, preferências e contextos socioculturais dos pacientes, atuando de forma integral nos processos de promoção da saúde,
prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação e cuidados paliativos, assegurando o protagonismo da pessoa no cuidado à sua saúde;
III – realizar anamnese e exame físico com raciocínio diagnóstico de forma ética, técnica e contextualizada, formulando hipóteses diagnósticas consistentes e, também, solicitando, interpretando e integrando exames complementares com base em evidências científicas, desenvolvendo raciocínio clínico, epidemiológico e capacidade de tomada de decisão segura e qualificada;
IV – atuar de maneira ética, empática e respeitosa nas relações estabelecidas com pacientes, familiares, equipes de saúde, colegas, gestores e comunidades, reconhecendo a diversidade humana e fundamentando-se nos princípios da dignidade, da equidade, dos direitos humanos e da justiça social;
V – atuar com responsabilidade social, pautada pelos princípios da cidadania, do respeito aos direitos humanos e da promoção da justiça social, atendendo às necessidades de saúde da população com rigor ético, responsabilidade profissional e respeito à diversidade, atuando em conformidade com os preceitos legais, normativos e deontológicos que regem o exercício da medicina;
VI – atuar de forma resolutiva, ética e comprometida nos diferentes níveis de atenção à saúde, com ênfase na atenção primária como coordenadora do cuidado e ordenadora das redes de atenção, garantindo a integralidade da atenção, contribuindo para a construção de um sistema de saúde centrado nas necessidades das pessoas, das famílias e das comunidades, respeitando os princípios da equidade, continuidade do cuidado e participação social;
VII – promover inovações tecnológicas relacionadas à assistência e à gestão em saúde, de forma crítica, ética e eficiente, incluindo, entre outras, ferramentas como Inteligência Artificial – IA, telemedicina, procedimentos minimamente invasivos, algoritmos de aprendizado de máquina, análise de dados em larga escala – Big Data e redes neurais artificiais;
VIII – assegurar a garantia de acessibilidade e o comprometimento com a confidencialidade das informações, demonstrando competências comunicacionais nas dimensões verbal, não verbal e escrita, com ênfase na escuta qualificada, na interpretação e interação respeitosa com indivíduos, famílias e equipes, recomendandose a proficiência em, ao menos, uma língua estrangeira e a familiaridade com tecnologias da informação e comunicação, incluindo o uso ético e crítico de plataformas digitais e ferramentas de IA, com foco na otimização do cuidado, na integralidade da atenção e na ampliação do acesso aos serviços de saúde;
IX – exercer liderança colaborativa em ambientes interprofissionais, orientada pelos princípios do cuidado centrado na pessoa, do trabalho em equipe e da corresponsabilidade na produção da saúde, articulando-se com o eixo da gestão ao incorporar práticas de coordenação de processos, tomada de decisão baseada em evidências, uso de dados e tecnologias emergentes, e vinculando-se, também, ao eixo da educação, ao promover a construção coletiva do conhecimento, e ao eixo da pesquisa, ao estimular a análise crítica e o aprimoramento contínuo dos modelos de atenção;
X – desenvolver ações com responsabilidade, práticas seguras, eficazes e fundamentadas nas melhores evidências científicas disponíveis, sendo capaz de interpretar criticamente a literatura, adotar protocolos assistenciais validados, monitorar desfechos clínicos e incorporar permanentemente novos conhecimentos à prática, promovendo a qualidade do cuidado e a segurança do paciente em todos os contextos assistenciais, com a medicina baseada em evidências;
XI – reconhecer, acolher e valorizar as múltiplas dimensões da diversidade humana, incluindo aspectos biológicos, subjetivos, étnico-raciais, de gênero, de orientação sexual, político-ideológicos, ambientais, socioeconômicos, culturais e religiosos, atuando com base nos princípios dos direitos humanos, promovendo a equidade, a inclusão e a justiça social, com especial atenção às necessidades de grupos minoritários e populações em situação de vulnerabilidade, estimulando, ademais, a singularidade do cuidado às populações vulnerabilizadas, invisibilizadas ou historicamente negligenciadas como as das águas, dos campos e das florestas, em situação de rua, negras, indígenas, quilombolas, LGBTQIAPN+, privadas de liberdade, Pessoas com Deficiência – PCD, migrantes, refugiados, apátridas, dentre outras;

XII – exercitar a empatia, a escuta qualificada, a comunicação eficaz e a capacidade de trabalho colaborativo, estabelecendo relações respeitosas e construtivas com pacientes, familiares, equipes de saúde e a comunidade, onde a atuação deve ser pautada por uma prática humanizada, centrada na pessoa, que valorize o vínculo, a corresponsabilidade e a articulação com equipes interprofissionais em diferentes contextos assistenciais;
XIII – participar de processos de educação permanente e continuada, como parte integrante de sua identidade profissional, reconhecendo limites e potencialidades, mantendo-se atualizado ao longo de toda a vida, com base na reflexão crítica da
própria prática, na incorporação de evidências científicas e no compromisso com a melhoria contínua da qualidade do cuidado em saúde, orientando-se pelas necessidades de saúde da população, pela prática baseada em evidências e pelo avanço científico e tecnológico;
XIV – ser capaz de atuar em emergências sanitárias e desastres naturais ou antropogênicos, demonstrando competência em biossegurança, vigilância em saúde, gestão de riscos e resposta rápida a crises, incluindo pandemias, acidentes de grande escala e eventos climáticos extremos, e compreender os impactos sociais, ambientais e epidemiológicos dessas situações, bem como as possibilidades de articulação com redes de atenção e proteção à saúde;
XV – compreender criticamente os determinantes sociais da saúde, biológicos, ambientais, econômicos e de estilos de vida que influenciam a saúde de indivíduos e comunidades, atuando sobre os impactos das mudanças climáticas, da degradação ambiental e da poluição, e compreendendo a transição demográfica e os determinantes da saúde no envelhecimento, sendo capaz de promover ações intersetoriais de prevenção, adaptação e mitigação dos efeitos dessas transformações, contribuindo para a sustentabilidade dos sistemas de saúde e para a proteção da vida em todas as suas dimensões;
XVI – exercer compreensão crítica das dinâmicas do mercado de trabalho e das políticas públicas de saúde, atuando de forma ética, reflexiva e eficiente diante das transformações sociais, econômicas e institucionais que impactam o exercício profissional, devendo estar apto a integrar-se a diferentes contextos de atuação e a contribuir para a formulação, implementação e avaliação de políticas de saúde que promovam a equidade, a qualidade e a sustentabilidade do SUS e do sistema suplementar;
XVII – reconhecer a importância do autocuidado como componente essencial de sua formação e prática profissional, promovendo ativamente seu bem-estar físico, mental, emocional e social, adotando estratégias de equilíbrio pessoal que favoreçam uma atuação clínica, acadêmica e institucional ética, saudável e sustentável, prevenindo o adoecimento e contribuindo para a longevidade e qualidade do exercício profissional;
XVIII – compreender os princípios da gestão em saúde e a necessidade do uso racional dos recursos, priorizando a sustentabilidade do SUS, devendo estar apto a tomar decisões clínicas e organizacionais que considerem as necessidades individuais e coletivas da população, as evidências disponíveis e as limitações operacionais do sistema de saúde, contribuindo para a eficiência, a equidade e a responsabilidade na alocação dos recursos;
XIX – dispor-se a atuar em processos educacionais interprofissionais, dialógicos e socialmente referenciados, fundamentados na reflexão crítica sobre a prática e na atualização contínua do conhecimento científico, assumindo corresponsabilidade pela própria formação e pela formação de outros estudantes, profissionais, equipes de saúde e da comunidade, respeitando os saberes prévios, os contextos socioculturais envolvidos e os princípios da educação permanente em saúde;
XX – adotar práticas clínicas seguras, fundamentadas em evidências científicas e protocolos validados, com foco na prevenção de riscos e na promoção da integridade física e emocional do paciente, da equipe de saúde e do próprio profissional em todos os contextos assistenciais;
XXI – utilizar, de forma integrada, crítica e contextualizada, os conhecimentos das ciências biomédicas, clínicas, epidemiológicas e sociais para subsidiar a tomada de decisões clínicas, a resolução de problemas de saúde e a promoção da saúde individual e coletiva, sempre fundamentado nas melhores evidências científicas disponíveis;
XXII – atuar de forma colaborativa, respeitosa e integrada em equipes interprofissionais, reconhecendo e valorizando os saberes e competências de cada membro e contribuindo para o cuidado integral, seguro, resolutivo e centrado na pessoa, promovendo a corresponsabilidade e a articulação entre os diferentes níveis e setores da atenção à saúde;
XXIII – respeitar e proteger a autonomia, a dignidade, a privacidade e a confidencialidade dos pacientes, assegurando o exercício pleno de seus direitos e promovendo o cuidado informado e compartilhado, estimulando a participação ativa dos indivíduos nas decisões relativas à sua saúde, de acordo com os princípios éticos, legais e humanitários;
XXIV – comprometer-se com o sistema de saúde, de maneira responsável, íntegra e respeitosa conforme os princípios éticos, legais e deontológicos que regem o exercício da Medicina e a organização do SUS, cumprindo os marcos regulatórios e normativos vigentes, promovendo a justiça, a equidade e o interesse público na prática profissional, e notificando, registrando e comunicando adequadamente: agravos, doenças, acidentes, eventos adversos, violências, entre outras;
XXV – orientar-se pela avaliação crítica de tecnologias, de intervenções e de condutas clínicas com base em critérios de custo-efetividade, impacto social, benefícios clínicos e sustentabilidade do sistema de saúde, fundamentando as decisões em evidências científicas e princípios de equidade, assegurando o uso racional e ético dos recursos disponíveis com a finalidade de responder às necessidades de saúde da população brasileira;
XXVI – assegurar a garantia da proteção de dados pessoais, cumprindo os princípios e diretrizes da Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD e demais normativas correlatas, zelando pela segurança, confidencialidade, integridade e uso responsável das informações pessoais e sensíveis de pacientes, profissionais e instituições, em todos os contextos de atuação médica; e
XXVII – elaborar prontuários, registros clínicos, laudos e demais documentos técnicos com clareza, precisão, padronização e fidedignidade, utilizando as tecnologias disponíveis, observando os preceitos éticos e legais, assegurando que a documentação contribua para a continuidade, segurança e qualidade do cuidado, bem como para a comunicação efetiva entre os profissionais e serviços de saúde.
Art. 9º A formação deve assegurar a compreensão crítica dos determinantes sociais da saúde, do direito à saúde e dos princípios constitucionais que regem o SUS, como a universalidade, a equidade e a integralidade, os quais devem orientar a conduta profissional em todos os ambientes de atuação.
Art. 10. A adoção de tecnologias deverá observar a viabilidade técnicooperacional, os princípios de sustentabilidade, a equidade no acesso e a racionalidade na utilização dos recursos disponíveis no sistema de saúde e, também, a utilização das tecnologias digitais em saúde de forma ética, crítica e responsável, assegurando a privacidade, a confidencialidade e a integridade das informações dos pacientes, garantindo, assim, que o uso dessas ferramentas preserve e qualifique a relação médico-paciente, promova a equidade no acesso e respeite os marcos legais e regulatórios vigentes.
Art. 11. O graduado deve estar apto para promover o diálogo, a escuta qualificada e a compreensão mútua como fundamentos essenciais da prática clínica e da colaboração em saúde, considerando as singularidades das pessoas, seus saberes e culturas, crenças religiosas e espirituais, autonomia, história, assimetrias de poder e impactos das mensagens comunicadas.
CAPÍTULO IV
DA ORGANIZAÇÃO DO CURSO
Art. 12. É responsabilidade da gestão do Curso de Graduação em Medicina a promoção de práticas inclusivas e acessíveis na formação médica, garantindo a equidade no processo formativo por meio da implementação de metodologias pedagógicas acessíveis, a oferta de recursos ou infraestrutura, assegurando condições adequadas de aprendizagem para estudantes com diferentes perfis e necessidades, incluindo pessoas neuroatípicas e neurodivergentes, com o objetivo de garantir as adaptações razoáveis, o respeito à diversidade e ambientes educacionais inclusivos, comprometidos com a permanência, com o pertencimento e com a acessibilidade estudantil, bem como com o pleno desenvolvimento acadêmico de todos os estudantes.
Art. 13. O Curso de Graduação em Medicina deve ser ofertado na modalidade presencial, com carga horária mínima de sete mil e duzentas horas, distribuídas em períodos anuais ou semestrais, conforme estabelecido no Projeto Pedagógico do Curso – PPC.
Art.14. Deve ser constituído um Núcleo Docente Estruturante – NDE, com atuação permanente e qualificada nos processos de concepção, implementação, consolidação, avaliação e atualização contínua do PPC, sempre buscando envolver todos os segmentos que compõem a comunidade acadêmica nesses processos.
Art. 15. O Curso de Graduação em Medicina deve dispor de infraestrutura física, tecnológica e de recursos humanos adequados, que assegure a plena execução do PPC, tanto nos ambientes institucionais de aprendizagem quanto nos campos de prática externa, com supervisão de docentes ou preceptores habilitados.
Art. 16. A formação médica deve integrar, de forma indissociável, as atividades de ensino, pesquisa e extensão, promovendo a iniciação científica e a participação discente em projetos de extensão, em consonância com a Resolução CNE/CES nº 7, de 18 de dezembro de 2018.
Art. 17. O Curso de Graduação em Medicina deve estimular a participação dos estudantes em atividades acadêmicas e de pesquisa vinculadas a programas de pós-graduação lato sensu (Residência Médica) e stricto sensu, quando disponíveis, fomentando o pensamento crítico, a produção científica e o engajamento com a realidade social.
Art. 18. Devem ser adotadas metodologias pedagógicas ativas de ensinoaprendizagem, que promovam o protagonismo discente na construção do
conhecimento, favorecendo a integração curricular e o desenvolvimento progressivo de competências, respeitando a indissociabilidade entre ensino, pesquisa, extensão e inovação.
Art. 19. O eixo estruturante do desenvolvimento de um currículo baseado em competências deve estar orientado pelas necessidades de saúde dos indivíduos e das populações, considerando os princípios do SUS, quais sejam: integralidade, equidade, universalidade do cuidado e atenção humanizada.
Parágrafo único. Os conteúdos essenciais, em cada componente curricular, devem ser definidos a partir dessas competências, considerando a evolução digital e as bases técnico-científicas e éticas.
Art. 20. Deve-se promover a integração curricular e a interdisciplinaridade, articulando as dimensões biológicas, psicológicas, étnico-raciais, socioeconômicas, culturais, religiosas, ambientais e educacionais, no enfrentamento dos determinantes do processo saúde-doença e na construção do cuidado em saúde.
Art. 21. O Curso de Graduação em Medicina deve instituir o Núcleo de Apoio Pedagógico e Experiência Docente – NAPED, ou estrutura equivalente, com a finalidade de oferecer programa estruturado e atualizado de desenvolvimento docente continuado, com objetivo de fomentar a educação permanente, o aprimoramento de competências pedagógicas, o comprometimento com os princípios do SUS e a integração ensino-serviço-comunidade.
Parágrafo único. O NAPED deve ser composto por docentes com experiência e conhecimento técnico-pedagógico, dedicados à qualificação contínua de seus pares e à promoção da excelência acadêmica.
Art. 22. A formação médica deve estar intrinsecamente vinculada às necessidades sociais de saúde da população, mediante a efetiva integração ensino-serviçocomunidade, com ênfase na valorização, no fortalecimento e na consolidação do SUS.
Art. 23. O Curso de Graduação em Medicina deve ofertar múltiplos ambientes e estratégias pedagógicas nos três níveis de atenção à saúde no SUS, proporcionando ao estudante vivências reais em políticas públicas de saúde, em ambientes diversos, com enfoque no trabalho em equipe interprofissional e na corresponsabilidade pelo cuidado.
Art. 24. O Curso de Graduação em Medicina deve prover ambientes de aprendizagem protegidos, controlados e tecnicamente adequados, como laboratórios de habilidades e simulação clínica, que garantam a segurança do paciente, a
sistematização do ensino e a oportunidade de identificação e análise do erro como instrumento pedagógico de aprimoramento profissional.
Parágrafo único. O aprendizado em cenários de prática simulados tem caráter preparatório ao exercício prático do cuidado às pessoas, na rede de serviços de saúde, devendo o aprendizado em ambientes de prática dos serviços de saúde ser predominante ao longo de toda a formação médica.
Art. 25. A formação médica deve incluir estágio curricular obrigatório em serviço (internato), realizado sob supervisão qualificada de docentes, somado à participação de preceptores, em unidades próprias, conveniadas ou vinculadas por meio de Contrato Organizativo da Ação Pública Ensino-Saúde – Coapes ou outros instrumentos previstos em políticas públicas, junto a instituições do âmbito federal, estadual ou municipal.
Parágrafo único. A preceptoria exercida por profissionais do serviço de saúde deve ter obrigatoriamente supervisão de docentes próprios da Instituição de Educação Superior – IES.
Art. 26. O Curso de Graduação em Medicina deve desenvolver e manter ações pedagógicas permanentes de formação e desenvolvimento dos profissionais da rede de saúde envolvidos na formação médica, em articulação com os gestores municipais e estaduais, com base nos Coapes ou outros dispositivos normativos em vigor.
Art. 27. A IES deve manter uma política estruturada de apoio à saúde mental, física e social dos estudantes, assegurando suporte integral, contínuo e acessível ao longo da formação, e deve contemplar ações de promoção do autocuidado, prevenção de agravos e intervenções precoces, favorecendo o bem-estar e a permanência qualificada dos discentes.
Art. 28. A organização e o planejamento acadêmico do Curso de Graduação em Medicina, incluindo a definição da semana-padrão, devem assegurar a presença de “áreas verdes” ou janelas curriculares qualificadas, em todos os períodos, inclusive no internato.
§ 1º As janelas curriculares de que trata o caput consistem em intervalos regulares e planejados sem atividades curriculares obrigatórias, com o objetivo de:
I – garantir tempo protegido para autocuidado, recuperação física e mental dos estudantes;
II – permitir a realização de atividades extracurriculares relevantes, como pesquisa, extensão, aprofundamentos acadêmicos, mentorias, participação em congressos, vivências práticas optativas ou estágios eletivos; e
III – favorecer a flexibilidade formativa, respeitando o ritmo de aprendizagem individual e promovendo o desenvolvimento integral do estudante.
§ 2º A inclusão de janelas curriculares deve ser estruturada de forma equitativa, garantindo que não haja sobreposição de conteúdos obrigatórios e que sua existência não prejudique a integralidade do currículo, nem comprometa o cumprimento da carga horária mínima regulamentar.
Art. 29. O Curso de Graduação em Medicina deve dispor de um programa institucional estruturado de acompanhamento estudantil, com ações sistemáticas voltadas ao bem-estar físico, mental e emocional dos discentes e deve oferecer suporte acadêmico e psicossocial, favorecer a adaptação ao curso, apoiar o progresso acadêmico e promover o desenvolvimento de competências profissionais e habilidades para a vida, oferecendo programa de mentoria em que docentes e preceptores possam acompanhar estudantes ao longo da graduação, contribuindo para formação da identidade profissional do futuro médico.
Art. 30. A instituição deve manter um núcleo ou centro institucional de inclusão e pertencimento, voltado à promoção de um ambiente educacional equitativo, acolhedor e representativo da diversidade étnico-racial, cultural, social, de gênero e de orientação sexual e deve coordenar e articular políticas institucionais de inclusão e pertencimento, programas de capacitação, acolhimento psicossocial, escuta qualificada e ações permanentes de sensibilização para o respeito à diversidade.
Art. 31. Os estudantes devem ser inseridos, desde os períodos iniciais do Curso de Graduação em Medicina, em atividades práticas, nos diferentes níveis de atenção à saúde, preferencialmente, em serviços que integram a rede pública do SUS, reconhecendo que todos os ambientes que produzem cuidado em saúde constituem espaços formativos relevantes, e essa inserção deve ser integrada aos componentes curriculares e ampliada progressivamente até o internato.
Art. 32. O internato deverá corresponder a, no mínimo, 35% (trinta e cinco por cento) da carga horária total do Curso de Graduação em Medicina, com duração mínima de dois anos, devendo ser integralmente supervisionado por docentes da IES, com a participação de preceptores qualificados.
§ 1º A realização de até 25% (vinte e cinco por cento) dessa carga horária poderá ocorrer em instituições externas, desde que devidamente conveniadas, preferencialmente vinculadas ao SUS, e que ofertem Programas de Residência Médica reconhecidos e credenciados pela Comissão Nacional de Residência Médica – CNRM, devendo a IES assegurar a presença ativa de seus docentes na supervisão acadêmica e garantir que os campos de prática externos atendam a padrões mínimos de qualidade, infraestrutura e segurança, conforme critérios definidos em normativas complementares do Ministério da Educação e dos Conselhos de Saúde.
§ 2º Pelo menos 30% (trinta por cento) da carga horária total do internato deverá ser cumprida em ambientes de Medicina de Família e Comunidade – MFC e de Urgência/Emergência do SUS, com distribuição proporcional entre essas áreas, assegurando vivência prática nos serviços de atenção primária e em unidades de pronto atendimento e emergência hospitalar.
§ 3º Os 70% (setenta por cento) restantes da carga horária do internato deverão contemplar, de forma transversal, integrada e supervisionada, as áreas de Clínica Médica, Cirurgia, Ginecologia e Obstetrícia, Pediatria e Saúde Mental, englobando conhecimento de Saúde Coletiva, Medicina Intensiva e Traumato-Ortopedia, considerando que essas áreas deverão ser organizadas em estágios específicos e/ou rodízios distribuídos ao longo do internato, assegurando a formação generalista, crítica, reflexiva e humanista do futuro médico.
Art. 33. As atividades práticas devem priorizar o desenvolvimento de competências coerentes com os perfis epidemiológico e demográfico do país, assegurando a formação para o manejo das condições de saúde mais prevalentes, incluindo doenças cardiovasculares, infecciosas, crônicas não transmissíveis, agravos externos (como traumas e violências) e outras situações de impacto na saúde pública, devendo, ainda, contemplar os cuidados paliativos em condições ameaçadoras à vida, promovendo a integralidade do cuidado em todos os ciclos da vida.
Art. 34. Cada área ou rodízio do internato deverá incluir uma carga horária teórica entre 5% (cinco por cento) e 15% (quinze por cento) da carga horária total prevista para a respectiva área, destinada à contextualização teórico-prática, à discussão de casos, à atualização baseada em evidências e à consolidação dos conteúdos essenciais para a prática clínica supervisionada.
Art. 35. A jornada semanal das atividades práticas poderá incluir plantões de até doze horas diárias, desde que respeitado o limite de quarenta horas semanais, conforme disposto na Lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008.
Art. 36. O PPC deve prever um sistema de avaliação que possibilite o monitoramento sistemático do desempenho do estudante, de forma institucionalizada, contínua, abrangente e integrada, alinhada às competências previstas no perfil do egresso e fundamentada nos princípios da avaliação programática, aplicada para cada componente curricular, incluindo o internato, devendo a avaliação ser padronizada para todos os componentes curriculares, contemplando as dimensões formativa, somativa e informativa ou diagnóstica, orientada pelas competências esperadas para cada etapa da sua formação, com devolutiva individual obrigatória, tempestiva e qualificadora (feedback), contribuindo tanto para a progressão acadêmica do estudante quanto para a avaliação e o aprimoramento do próprio PPC.
Parágrafo único. Deverá ser prevista, obrigatoriamente, a realização de, ao menos, uma avaliação somativa abrangente imediatamente anterior ao início do
internato, com o objetivo de assegurar que o estudante possua as competências mínimas exigidas para a atuação supervisionada em ambiente clínico real.
Art. 37. O sistema de avaliação deverá contemplar três domínios da competência para a prática profissional, quais sejam:
I – o Domínio Cognitivo – saber e saber como;
II – o Domínio Psicomotor – demonstrar e realizar habilidades profissionais, em cenários simulados e controlados e em ambientes reais da prática profissional; e
III – o Domínio Atitudinal – ser, estar e relacionar-se, que inclui atitudes, adesão aos valores e comportamentos esperados do médico.
§ 1º Nos casos de baixo desempenho ou dificuldades identificadas, deverá ser elaborado um plano de ação individualizado, conduzido por docentes ou preceptores, com acompanhamento próximo e oferta de recursos pedagógicos complementares, como tutorias, revisões dirigidas e treinamentos práticos personalizados.
§ 2º O PPC deve incluir um sistema de avaliação contínua, específica e estruturada do internato, que permita o monitoramento sistemático do desempenho do estudante.
Art. 38. Estas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina deverão ser integralmente implantadas no prazo de quatro anos, a contar de sua publicação.
Art. 39. Os Cursos de Graduação em Medicina em funcionamento terão o prazo de um ano, a partir da data de publicação desta Resolução, para aplicação das presentes determinações às turmas abertas após o início da sua vigência.
Art. 40. Fica revogada a Resolução CNE/CES nº 3, de 20 de junho de 2014.
Art. 41. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
OTAVIO LUIZ RODRIGUES JR


(Publicado no DOU nº 187, quarta-feira, 1º de outubro de 2025, Seção 1, páginas 35-37)

Fonte: Diário Oficial da União

Foto de capa: Artem Podrez

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