Rita Grassi resgata obra do filósofo Raimon Panikkar, com abordagem do pluralismo religioso e combate ao colonialismo
Após retornar à vida acadêmica aos 38 anos, a pesquisadora Rita Grassi conquistou o Prêmio CAPES de Tese de 2025 na área de Ciências da Religião. Sua trajetória, iniciada nas Relações Internacionais, culminou em um doutorado em cotutela entre a PUC-Minas e a École Pratique des Hautes Études (França), focando na obra do filósofo espanhol Raimon Panikkar. Ao trabalhar com arquivos inéditos e gravações exclusivas encontradas na Espanha e nos Estados Unidos, a tese La contribution académique de Raimon Panikkar aux études des religions: du pluralisme religieux à la méthode interculturelle comme voie vers la paix reconstrói a teoria de Panikkar sobre o diálogo intercultural como um caminho para a paz. Agora, Grassi quer dar continuidade ao estudo, aprofundando-se no pluralismo religioso como ferramenta contra o colonialismo intelectual.
Sobre o que é a sua pesquisa? Explique o conteúdo da sua tese.
Trata-se de um estudo diacrônico das teorias de pluralismo religioso e do método intercultural de Raimon Panikkar, com foco em seu período acadêmico nos Estados Unidos, onde lecionou em Harvard (1967–1971) e na Universidade da Califórnia (1972–1987). Trabalhei com fontes inéditas: anotações, planos de aula, seminários, referências, consultadas na Espanha, além de áudios exclusivos de seminários e discussões na universidade. A partir dessas fontes, investiguei a correlação entre as disciplinas que Panikkar lecionou e a formulação de suas teorias; a aplicação dessas teorias no projeto cuja tese era “a interculturalidade como caminho para a paz”; e a sua possível contribuição para os Estudos das Religiões. O trabalho também questiona, de modo crítico, por que, apesar do reconhecimento de pares e alunos, Panikkar permanece frequentemente à margem dos cânones da filosofia, da teologia e das ciências da religião.

Imagem: Rita Grassi (Arquivo pessoal)
O que vale destacar de mais relevante na sua pesquisa?
O acesso aos arquivos acadêmicos e às gravações de seminários me possibilitou reconstruir a gênese das teorias de Panikkar, evidenciando como o ensino e elaboração conceitual se alimentavam mutuamente. A partir desse material, identifiquei a sistematização de um método intercultural para os estudos das religiões, articulando pluralismo e interculturalidade como estratégia de paz. Também mostro a passagem de uma teologia ainda inclusivista para uma atitude pluralista radical, situada no contexto de consolidação dos Estudos Religiosos nos EUA.
De que forma a sua pesquisa pode contribuir para a sociedade?
Ao disponibilizar conteúdo inédito e ao analisar a interculturalidade como caminho para a paz, a pesquisa oferece uma abordagem que se contrapõe ao colonialismo intelectual e à homogeneização cultural. O trabalho abre espaço para o diálogo inter-religioso e intercultural, incluindo também vozes não religiosas (ateias e humanistas). Na prática, isso pode fortalecer processos educativos, políticas de reconhecimento, mediações de convivência plural e debates públicos sobre diversidade, democracia e paz.
Qual a importância para você de sua tese ter sido escolhida a melhor na área?
Esse reconhecimento valida um trabalho de base histórica e crítica, apoiado em fontes primárias pouco exploradas, e dá visibilidade a um autor central para pensar o pluralismo e a interculturalidade. Ele também sinaliza a pertinência de revisitar trajetórias “marginais” ao cânone para compreender contribuições efetivas aos Estudos das Religiões e ao diálogo intercultural e inter-religioso no cenário internacional. Pessoalmente, é um marco que reforça a relevância da área e o lugar das mulheres pesquisadoras nesse campo majoritariamente masculino. Isso me deu mais motivação para dar continuidade à mentoria Retomada Acadêmica, que ofereço para mulheres com mais de 40 anos que querem fazer mestrado ou doutorado.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
Fonte: Redação CGCOM/CAPES
Foto de capa: Marca dos 20 anos do Prêmio CAPES de Tese (CGCOM/CAPES)
